January 31, 2009

Episódio 05: Interface de fogo...

Nós tínhamos que comentar esta, ou não seriamos nós informáticos a sério.

Imagina-se logo o diálogo entre as labaredas e o nosso interface "user-friendly" e compatível com qualquer tipo de sistema operativo instalado seja em que lugar for.

Interface: "Ora muito bom dia cavalheiro, seleccione que apartamento deseja chamuscar se faz favor. Ah como? Qualquer um? Não, não, terá que especificar 1, não podemos deixar queimar assim sem autorização dos respectivos proprietários. Ah só pretende uma visitinha de médico é? Uma chamuscazinha? Está bem então, sendo assim já é diferente.
Aqui está, pode fazer login aqui neste formulário. Não se lembra da password? Não há problema nenhum, digite aqui o seu email e enviaremos um link para fazer reset... Já o recebeu e já clicou? Ok, vamos prosseguir então com o seu trial. Não o podemos é deixar entrar no quarto andar, sabe como é, foi restaurado o ano passado e isto não pode ser todos os anos."

As labaredas seriam então convidadas a experimentar as fantásticas alcatifas e madeiras que queimam que é uma maravilha.
Terminada a demonstração de 30 dias sem encargos nem compromissos seriam constantemente "assediadas" com popups a pedir uma quantia irrisória para poderem desfrutar da destruição total do fantástico prédio, com a excepção claro está do 4º andar (que se alguém perguntar diremos que não é o nosso!).

January 26, 2009

Episódio 04: Para reflectir...

Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, - reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta  (...).

 

Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta ate à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados (?) na vida intima, descambam na vida publica em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na politica portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro (...).

 

Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do pais, e exercido ao acaso da herança, pelo primeiro que sai dum ventre, - como da roda duma lotaria. A justiça ao arbítrio da Politica, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.

 

Dois partidos (...), sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes (...) vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se amalgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, - de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar (...).

 

Guerra Junqueiro, in "Pátria", (1896)